Lia Quintana entrega gestão de 12 anos que salvou a FAT, Urcamp e o Hospital Universitário
O ano era 2009, e o noticiário publicava rotineiramente a situação crítica da Urcamp, que beirava a falência, evidenciando que professores e funcionários viviam na incerteza dos salários, ao passo que a equipe diretiva realizava viagens. Acordos Coletivos não eram cumpridos e gradativamente os colaboradores foram perdendo sua dignidade e aumentando suas dívidas advindas da falta de remuneração. Quando parecia não haver mais esperança, a professora e engenheira civil Lia Maria Herzer Quintana aceitou o desafio de concorrer e conquistar a reitoria. Sua missão apenas começava e, com ela e em suas mãos, junto aos professores e funcionários, transformar em possível aquilo que se dizia ser improvável: refundar a Urcamp.
Quem trabalhava ou tinha familiares, amigos ou conhecidos na então Universidade da Região da Campanha, testemunhou essa triste história naquela época. Na edição de março de 2009 do Período Livre – do Sindicato dos Professores (Sinpro/RS), foi divulgada uma avaliação pela Assessoria Financeira e Contábil do Sindicato que finalizou com a seguinte afirmação: “Diante das análises realizadas, fica evidente que a Urcamp apresenta dificuldades históricas, sobre o que se permite concluir ser improvável a sua recuperação econômica-financeira diante das circunstâncias em que se encontra”. Na mesma matéria, as demonstrações apontavam que no balanço daquele ano a Instituição tinha disponível, a longo prazo, R$ 0,14, para cada R$1,00, devido; e a curto prazo, tinha R$0,06, para cada R$1,00, de endividamento.
Liderada por Lia Quintana, a gestão desafiou esse terrível prognóstico, recuperou a Urcamp e inaugurou um novo cenário administrativo e acadêmico, evidenciada pela demonstração financeira do período compreendido entre 2010-2022, tendo como déficit os anos de 2010, 2011 e 2012 – início de sua gestão, e, a partir de 2013, o superávit até os dias atuais. No entanto, as conquistas em nome da Instituição de Ensino são traçadas na seguinte linha do tempo: em 1989, a Urcamp foi reconhecida como Universidade; entre 2010 e 2012, houve o redimensionamento educacional; de 2010 a 2018, a reorganização acadêmica e o recredenciamento no MEC; em 2018, a visita institucional com nota máxima do Ministério da Educação – Conceito 5, que autorizou o recredenciamento; ainda em 2018, o reposicionamento acadêmico – lançamento da Graduação i; em 2019, o credenciamento do Ensino a Distância com nota máxima, novamente, junto ao MEC, e início da Graduação i; em março de 2020, pandemia da Covid-19; em janeiro de 2022, implantação da Graduação i Flex.
Na reunião de prestação de contas da Gestão 2010-2022, apresentada no Salão de Atos do Campus Central e ao vivo pelo Meet com os demais campi, na manhã da última segunda (28/11), Lia mostrou o resumo total de pagamentos de passivos de R$196.002.776,05; nestes quase 12 anos, foram quitados R$121.310.490,29. O saldo, portanto, é de R$74.692.285,76. Os destinos foram: [1] repasse – expediente TRT; [2] bloqueio bancário de ações trabalhistas 2011-11/06/2013; [3] acordos rescisórios verbas + FGTS de setembro de 2013; [4] acordo rescisórios Sinpro/Sintae – 6% dos títulos pagantes; [5] acordos rescisórios Urcamp Sintae e Sinpro; [6] salários atrasados 2005/2006/2007/2008/2010/2012; [7] empréstimos balanço 2010 – quitado em 2015; [8] juros e encargos pagos – sobre empréstimos; [9] contas a pagar – fonte balanço 2010 – liquidado em 2011; [10] renegociações – fornecedores e funcionários; [11] 13º salário – 20 e 21 e ⅓ férias – 20/21 (professores); [12] rescisórias – Urcamp parcelas atrasadas; [13] fornecedores/prestadores em atraso ‘não negociados’; [14] Proies previdenciário; [15] FGTS ativos e rescisórios.
O Hospital Universitário (referência regional), também foi amplamente recuperado pela gestão de Lia Quintana, com a seguinte cronologia: [1] revitalização e redimensionamento; [2] implantação do Hospital Escola – vivência e prática dos alunos em soluções de problemas reais, curricularização da extensão; [3] reformas na unidade 3; [4] fechamento da CTI – após auditoria de serviço deficitário em função da tabela SUS e as exigências legais; [5] reforma da lavanderia, CME; [6] unidade autônoma de oxigênio; [7] construção e instalação do tomógrafo; [8] digitalização do raio X; [9] implantação e construção da oftalmologia, aumento de contratualização; [10] reforma e instalação dos elevadores – acessibilidade total; [11] setor administrativo – reforma e reaproveitamento antigo bloco cirúrgico; [12] pintura externa e revitalização; [13] construção e instalação de gerador que atende todo o hospital; [14] reformas diversas para adequação dos apontamentos da vigilância; [15] e em aprovação unidade de cuidados prolongados – recurso emenda liberado – aguardando aprovação de projeto no órgão fiscalizador vigilância da saúde (de acordo com as normas da Anvisa). No âmbito tecnológico, os avanços foram: [1] sistema de gestão hospitalar SIGH; [2] sistema de controle de medicamentos – checagem à beira leito, rastreabilidade e controle de lote; [3] integração do sistema de cômpeto FAT-Urcamp-HU; [4] fluxo de processos; [5] sistema de telelaudos e radiologia; [6] em implantação da funcionalidade: sistema de assistência enfermagem no Sigh.
Por falar em saúde, durante a pandemia da Covid-19, a gestão pontua: [1] laboratório Covid – implantação de exame PCR – diagnósticos em 12 horas; [2] atendimento e testagem de todos os prestadores da Fundação Attila Taborda, com atendimento médico, psicológico e fisioterápico, mesmo aos prestadores que, em grande maioria, estavam em home office; [3] aquisição de duas máquinas e doação de uma pelo Banrisul – indicação Secretaria de Saúde; [4] unidade Covid – adaptação das instalações da CTI; e [5] agendamento digital para os atendimentos covid, sem necessidade de deslocamento, com laudo por e-mail/WhatsApp e envio para controle sanitário.
A gestão liderada por Lia Quintana, encerrada neste dia 30/11, em cumprimento de decisão liminar processo n° 5013434-31.2022.8.21.0004/RS, em relação aos avanços tecnológicos na Urcamp, destacou: [1] sistema acadêmico segue; [2] sistema de fluxo de processos – Cômpeto; [3] sistema de plano de trabalho dos professores; [4] sistema de atas; [5] sistema de diplomas digitais – cumprimento exigência do MEC; [6] bibliotecas e laboratórios virtuais; [7] atendimento digital – Omnichannel – FAT/Urcamp nas redes sociais; [8] Plataforma de projetos integradores – projeto Pampa + Inovador, aprovado no edital nº 01/2021 do Programa Inova RS, da Secretaria de Inovação, Ciência e Tecnologia -SICT, no valor de R$500.000,00 para escala e implementação do sistema de conexão das hélices do ecossistema de inovação do pampa.
A plataforma de projetos chama-se Sou I Urcamp e é própria da Instituição, e através dela, os números são os seguintes: 20 cursos de graduação presencial; 15 cursos de graduação EaD; 27 cursos de pós-graduação; 3119 estudantes; 227 professores; 214 técnicos administrativos; 2004 demandas registradas; 9214 pessoas impactadas; 2220 projetos realizados; 430 empresas conectadas; 923 mentores colaborando e 11 cidades abrangidas.
Na semana anterior, cumprindo com o desejo antigo dos alegretenses, a Gestão de Lia realizou o sonho de pintar a fachada do campus Central e entregar esta obra era uma questão de compromisso com a cidade. “Nós passamos por anos muito difíceis, quando assumimos a Instituição, em 2010, a situação financeira era muito grave, além dos inúmeros passivos e dívidas trabalhistas. Com muito trabalho, ao longo desses anos, muita negociação, conseguimos equilibrar as contas, recolocar os salários em dia, alavancar inúmeras parcerias que estimularam o desenvolvimento regional, ampliar a grade de cursos, e hoje, Alegrete e os demais Campi, têm acesso às 20 graduações que ofertamos, e este prédio era um pacto nosso, uma meta, eu estou feliz em poder entregar esta obra pronta, tão importante para a comunidade, como última grande ação desenvolvida pela nossa gestão”, pontua Lia Quintana em entrevista recente. As tratativas para pintura já vinham em andamento desde 2019, mas em razão da pandemia, o projeto precisou ser interrompido. Só agora, através de cooperação e algumas negociações, o plano pode ser executado.
Desde o início de 2019, o novo modelo de ensino da Urcamp é a Graduação I, que é baseada no ensino por competências, gestão da aprendizagem, projetos práticos que são desenvolvidos a partir de demandas reais de empresas, instituições e membros da comunidade, além de competências pessoais e profissionais. Essa metodologia implantada pela Urcamp é, na verdade, o futuro da educação – como retratam diversas matérias veiculadas nacionalmente. Na edição de 18 de novembro de 2022, o artigo de opinião veiculado na Zero Hora, por Adriane Kiperman, diretora editorial da Edtech para o Ensino Superior e profissional +A Educação, e Gustavo Hoffman, especialista em gestão de instituições educacionais e fellow da Universidade de Harvard, ‘A cruzada do Ensino Superior’, pontua cada detalhe como um sinal de alerta para as Instituições que ainda não se adequaram – algo que já está consolidado na Urcamp há 4 anos. Cabe destacar o trecho: “Neste momento, fica evidente que o modelo tradicional expositivo, massivamente usado no Brasil, não atende às expectativas. Para um futuro próximo, as duas modalidades regulamentadas vigentes deverão se combinar organicamente, e o que precisa ser combatido são os modelos que não funcionam. As metodologias ativas, que colocam o aluno como ponto central do processo, impulsionando seu desenvolvimento e autonomia, ganham espaço”.
A CPP da Urcamp (Competências Pessoais e Profissionais), ministradas nas sextas-feiras, correspondem ao que o mercado de trabalho exige. No mesmo artigo, foi pontuado que: “Como não se sabe quais serão as competências do engenheiro ou do advogado do futuro, precisamos preparar todos os profissionais para essas novas exigências. O aluno precisa ser exposto a problemas factíveis do mundo real e desenvolver a capacidade de resolvê-los. O Massachusetts Institute of Technology (MIT), que investe nessa dinâmica, é reconhecido como um dos melhores formadores de profissionais de tecnologia. […] Ressalta-se que 80% das competências profissionais do século 21, listadas pelo Fórum Econômico Mundial, são soft skills, como capacidades de resolução de problemas, criatividade, comunicação, empatia e liderança. São características que independem das mudanças profissionais”.
O Dr. Geraldo Campos publicou no Linkedin o texto ‘Ambidestria Universitária: o desafio de ser relevante para a ciência e para o mercado’, no dia 26 de novembro de 2022. Neste, assim como o artigo da Zero Hora, fica evidente a capacidade visionária da gestão da Urcamp ao apostar na Graduação i. “O desafio da inovação universitária para uma ambidestria está na construção de uma organização inovadora e empreendedora; um processo de ensino-aprendizagem inovador; e, uma interação com ecossistema de forma empreendedora. […] Na perspectiva de um processo de ensino-aprendizagem inovador, a ambidestria está na construção de estratégias de aprendizagem de ensino, na pesquisa e na extensão, por meio de uma aprendizagem baseada em desafios e na experiência, a partir de ambientes de Ba; e da interação entre os atores, transformando o campus em um lab de experimentação para formação de competências”. Geraldo também arrisca dizer que: “[…] se ensinarmos apenas para o trabalho, estaremos criando robôs, pois todos terão as mesmas habilidades, saberão fazer as mesmas tarefas repetitivas e, em menos de 2 anos, não saberão o que fazer”.
Entrevista com Lia Quintana
Como era a Urcamp há 12 anos e como ela está hoje?
Há 12 anos ela estava passando por extremas dificuldades. Nós tínhamos frequentes perdas, não recebíamos salários; quatro meses era normal, e passamos por fases de seis meses de salários atrasados. Em julho de 2010 o reitor pediu para sair e assumiu a vice-reitora, professora Virgínia, e ela entendeu que teria dois anos de mandato, mas não queria, e convocou as eleições. As eleições começaram com um candidato único, o da atual gestão, e quando, num momento lá, a gente entendeu que tinha que colocar uma outra opção para, pelo menos, tentar mudar a instituição, montamos a nossa chapa em outubro. O plano estratégico foi construído no feriado de 2 de novembro, para as eleições que ocorriam no meio de novembro com posse em primeiro de dezembro. Logramos êxito, conseguimos mais de 70% dos votos em todas as categorias e começamos um trabalho de reconstrução na Urcamp. Existia, no balanço de 2009, que foi apresentado em julho de 2010, um boletim – uma consultoria encomendada pelo Sindicato dos Professores – dizendo que a Urcamp estava falimentar se não mudasse algumas situações. O índice de liquidez era de R$ 0,06, centavos a curto prazo e a longo prazo, R$ 0,14, centavos. Isso significava dizer que, a curto prazo, a cada R$ 1,00, que nós devíamos, nós tínhamos R$ 0,06, para pagar; da mesma forma, o índice de liquidez a longo prazo que, a cada R$ 1,00, nós tínhamos R$ 0,14, centavos para pagar. E essa foi a situação que nós recebemos a Urcamp, todos os computadores apagados – sem nenhum dado, um sistema acadêmico não confiável porque ele era manipulado, dependendo dos resultados que interessavam, fornecia. E começamos um trabalho de reconstrução. A primeira etapa foi muito difícil, quatro meses de salários atrasados; fomos bater na porta do banco Banrisul, que normalmente financiava o 13º, e ele não financiou. Naquela época, os campi tinham autonomia, conseguimos repartir as operações locais com o Banrisul nos outros campi, e fizemos o pagamento do décimo terceiro e, em uma credibilidade da Unicred, nós recebemos os valores para pagar o décimo terceiro de todos – que foi pago entre Natal e Ano novo – pois não conseguimos pagar no tempo correto. Pagamos nos primeiros dias de dezembro, o salário de novembro. E seguimos tocando o barco – tínhamos um valor de folha extremamente alto – na época tínhamos aproximadamente 7 mil alunos e 1,2 mil funcionários e professores – porém, a receita não cobria a despesa e começamos um trabalho muito forte. Tínhamos uma dívida de FGTS não recolhido que era muito alta, não tínhamos nenhum tipo de certidão negativa, dívida muito alta tributária e demais débitos, dívidas de banco, dívidas com pessoas desligadas, que simplesmente eram desligadas e não recebiam. Atrasamos os salários, também, porque quando nós pagamos o salário de novembro, que não era devido na nossa gestão, a gente fez um descompasso, então nós tivemos, sim, dois meses de salários atrasados, que, ao longo desses anos, a gente conseguiu organizar. Fizemos um movimento para uma negociação tributária, que foi o Proies – que trocava dívidas por bolsas, sendo pioneiros, então, em 2012, nós ingressamos neste Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior. Construímos, por conta de constantes bloqueios em contas da Instituição, um expediente administrativo no Tribunal da 4ª Região (TRT4), porque nós tínhamos várias comarcas trabalhistas. Então, nós construímos um tribunal de conciliação, onde entramos em um acordo que parte da arrecadação dos boletos operados pelo Banrisul iam para o pagamento das rescisórias. No ano de 2016, nós tivemos um problema com as ações de fundo de garantia, porque não tínhamos as negativas do Fundo e não recolhíamos o Fundo, e fizemos um acordo, também no Tribunal de Justiça, de que seriam compensados todos os valores pagos aos funcionários desligados pertencentes ao quinhão de fundo de garantia e, nesse sentido, começou a se operar, fizemos a confissão do fundo de garantia com o seguinte compromisso de que, a partir daquela data, não atrasaríamos mais o corrente do FGTS, o que ocorre até os dias de hoje, pois não temos nenhuma parcela em aberto do FGTS. Temos, na Instituição, várias camadas: os ingressantes (antes de setembro de 2016), que têm parcelas de FGTS não recolhidas; e os ingressantes após, que não têm nenhuma parcela de FGTS não recolhidas.
Tínhamos uma instituição que não tinha sofrido, em nenhum momento, uma avaliação a declaração de universidade em 1989; não tínhamos Conceito Institucional e começamos um trabalho de fazer o Credenciamento e a Avaliação in loco para ter o Conceito Institucional, porém, ao longo desse tempo, percebemos que não preenchíamos os requisitos de universidade, e fizemos a opção, portanto, em fazer um Recadastramento de Centro Universitário, para assegurar parte de nossa autonomia universitária. Trabalhamos, preparamos a casa e logramos a nota máxima no Recredenciamento. Hoje somos um Centro Universitário Conceito 5. Da mesma forma, quando trabalhamos para o cadastramento do EaD que tem Nota 5.
Ao longo dos anos, fomos adaptando e reduzindo o inchaço da instituição, reduzimos campi (Caçapava do Sul, Itaqui e São Borja), por conta da expansão da Unipampa, que se instalou em todos os lugares onde estavam os nossos campi e, principalmente, pela redução populacional dos locais onde nós tínhamos cursos e que não tinham ingresso. Hoje, a gente tem os campi de Bagé, Alegrete, Santana do Livramento e São Gabriel, com educação superior e o campus de Dom Pedrito com ensino básico e polo EaD.
Qual foi o maior, se é possível destacar apenas um, marco em toda a sua história de gestão?
O marco maior foi entrar na Urcamp com uma espada na cabeça, que todo mundo dizia que ela ia fechar e chegar aqui, há 12 anos, sendo 2 deles de pandemia. Se pegarmos toda a receita destes 12 anos e colocarmos o passado que a gente pagou, a gente trabalhou com 10 anos de receita; 2 anos de receita foram para pagar dívidas passadas que estão sempre demonstradas e representadas na nossa prestação de contas.
Não diria um marco, mas a gente puxou a Urcamp para fora dos muros. A gente participa de todas as associações que pertencem as instituições de educação superior: fomos na primeira reunião do Comung, em que fomos convocados e muito bem acolhidos e, daí para frente, participamos da Diretoria do Comung; comecei pelo Conselho Fiscal e agora presido o Comung em função da vacância do presidente em maio deste ano. Também fiz parte da Diretoria da Abruc e, em 2019, começamos a compor a Diretoria do Crub, como vice-presidente, e, atualmente, presido o Crub. A nossa gestão adquiriu um protagonismo muito importante durante a pandemia e conseguimos ser, hoje, pelo Crub, legitimados para interpor recursos no STF. Hoje estamos com uma matéria muito importante no Supremo que é o curso de medicina. Participamos de uma audiência pública no STF em outubro deste ano para elucidar os Ministros do STF, e suas assessorias técnicas, do alcance que a expansão e abertura de novos cursos de medicina representa para o país.
Conceito máximo pelo Ministério da Educação, oferecimento de cursos a distância, implantação de um modelo de ensino reconhecido internacionalmente, Hospital Universitário referência no estado; são inúmeras as conquistas da sua gestão. Quais os próximos desafios para a Urcamp?
Em 2018, já estávamos percebendo a crescente redução de alunos, principalmente por conta da insuficiência de políticas públicas de financiamento para a educação superior. Porém, também porque o ensino e os alunos estavam mudando. Fomos atrás de modelos e exemplos praticados com sucesso, e ao visitar duas Instituições do Paraná, entendemos o modelo exitoso e começamos a preparar o nosso, que é o modelo praticado na maioria das instituições do mundo, principalmente as norte americanas e na europa, que é a aprendizagem através de projetos, competências pessoais e profissionais, uma vez que essas competências, principalmente as pessoais, não eram entendidas como integrante da formação profissional. A gente constrói todas, inclusive as competências comportamentais. O nosso PI (projeto integrador), que é uma aprendizagem a partir de projetos reais, em uma plataforma que desenvolve todos esses segmentos é para o aluno, além da sua prática durante o seu exercício profissional, entender também a comunidade, o seu papel na sociedade e tentar fazer entregas, dentro do possível, das soluções encontradas perante as demandas.
Entender o seu tamanho, o momento que está sendo vivenciado, ficar conectada nas mudanças, porque muitas delas vieram durante os dois anos de pandemia, a reconstrução, o perfil do aluno que entra para estudar, a entrega que a sociedade está necessitando, em todos os âmbitos, graduação, pós-graduação, pesquisa e inovação, o aluno como seu protagonista, aprendizado e o que ele precisa, existe, sem sombra de dúvidas, uma certeza: o Brasil não alcançou as metas do Plano Nacional de Educação sobre formação superior. Na América do Sul, nós perdemos para todos os países nos índices de formação de ensino superior. Precisamos, sim, continuar estudando, incluindo, tendo formação. Pensar sobre essa questão de que as profissões vão ser diferentes, outras estão sendo revisitadas em função das mudanças.
Devolvestes a dignidade para funcionários e professores e seus familiares ao colocar o salário em dia. Essa realidade é conhecida pela grande maioria, mas para quem entrou na Urcamp a partir de 2010, ela é só uma história. Qual e como foi a pior fase daquela época?
Vamos dizer que eu sou egoísta, porque eu queria o meu salário em dia. Só que para eu ter o meu salário em dia, para eu ter dignidade e conseguir colocar a minha cabeça no travesseiro, todo mundo tinha que ter o salário em dia. Em outros momentos, na Instituição, isso não acontecia. Então, neste sentido, eu entendo que todas as pessoas, e aqui vem um recado para a nova gestão, todas as pessoas na Urcamp, mesmo os que votaram contra, a favor, os que fizeram opções – porque as opções fazem parte da democracia, precisam entender que isso foi um trabalho conjunto. Muitas vezes, quem tem a gestão não agrada a todos, as medidas não são para alguns, mas para todos. Em alguns momentos, algumas pessoas não conseguem entender.
Aqui eu registraria o grande descontentamento dos professores com relação às reduções de cargas horárias, que aconteceram, de fato, mas elas foram, durante toda a pandemia, mantidas, porque entendemos que não poderíamos deixar as pessoas fragilizadas em um momento muito ruim que o mundo inteiro vivenciou. Não praticamos nenhuma redução salarial, permitida por Lei, como foi amplamente divulgado nos meios de comunicação e mantivemos as cargas horárias dos professores também. Na virada da pandemia, o que aconteceu foi uma redução brusca de alunos, e uma redução muito grande de alunos pagantes; nós tínhamos, na proporção, os alunos com bolsas e os pagantes – mas continuamos, por obrigação e compromisso, de formar os alunos bolsistas. Essa redução fez um aporte financeiro menor e precisamos, sim, fazer redução de carga horária porque não tínhamos alunos e as disciplinas não ocorriam. Essa redução causou desconfortos e descontentamentos, mas em nenhum momento nós fizemos a opção tomada por outras instituições, que se viu e se noticiou, que eram as demissões em massa, de 300, 200, 100 professores e funcionários. Nós entendemos que naquele momento, no interior, onde nós estávamos vivendo demissões em massa de professores, que estes nossos professores, com redução de carga horária, ainda era uma realidade melhor do que as demissões.
Nestes 12 anos, conquistaste muitos méritos de liderança. Além da reitoria da Urcamp, acumulou cargos na Fundação Attila Taborda, Corede Campanha, Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas – Comung, Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras – Crub e Associação Brasileira das Universidades Comunitárias – Abruc. Através do teu nome, a Urcamp alcançou frentes jamais vistas. Qual o impacto que a tua saída faz para a Instituição em níveis estadual e nacional?
Tem que ser dada a continuidade, as associações continuam vivas e orgânicas, coordenadas por outros colegas. Existe um momento de transição, por óbvio eu tenho um trânsito político, apartidário, e ele é institucional. O meu partido é a Urcamp, o meu partido é o Comung, o meu partido é a Abruc, o meu partido é o Crub. Como todas essas entidades não precisam de posições partidárias, mas sim de redes com governos do executivo e do legislativo, é esse trabalho que se faz e ele tem que ser continuado e conquistado. Em algum momento vem o perfil e a forma de abordagem e o entendimento que os novos gestores farão sobre isso.
Uma situação muito evidente nesse pleito eleitoral e que eu entendo não ter sido necessária, foi tentar desconstruir a minha imagem. Só que a minha imagem não tem 12 anos, ela tem 62 anos. São 36 anos de trabalho e a minha imagem é deste tempo. Por óbvio que a Urcamp me trouxe, e eu não diria que levei sozinha a Urcamp para estes lugares, não; foi um trabalho conjunto porque num determinado momento nós nos abraçamos, as instituições necessárias lá do Proies, com Santa Catarina e outras tantas, e ali nos conhecemos e ali nos tornamos redes, muitos reitores não fazem mais parte, outros chegaram, mas sempre com o princípio da coletividade, do bem de todos.
Durante o pleito, nós conversamos com todos os candidatos ao Governo do Estado pelo Comung, em uma série denominada Diálogos. Agora, no dia 17 de novembro, fomos recebidos pelo vice-governador eleito, e dialogar nosso maior legado: a conquista de todas as comunitárias e seus reitores, de recursos da ordem de 0,5%, previsto na Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, para investir na educação comunitária, no qual eu tenho o orgulho de ter participado e ter sido interlocutora até 30 de novembro.
Trabalhar em uma instituição de ensino é contribuir com o futuro do país. No entanto, lutar pela educação em tempos de crise, pandemia e altos índices de evasão, é desafiador. Essa tua garra e comprometimento mantiveram viva a Urcamp. A Lia mudou a Urcamp; como a Urcamp mudou a Lia?
Todos dizem que a Lia está mais mansa, mais abrandada. Aprendi o momento de ouvir, de não rebater tudo e ouvir calada algumas coisas. Se todos observaram o pleito eleitoral, em nenhum momento eu ofendi alguém ou precisei de algum subterfúgio que não fosse o meu trabalho para fazer a campanha eleitoral. Fique bem evidente, sem qualquer dúvida, que a gestão que está assumindo agora, está assumindo com uma decisão judicial precária, porque uma decisão liminar é uma decisão precária – por entendimento de juiz e como todos nós sabemos, decisão de juiz não se discute, se cumpre. O entendimento dele foi esse. Então, essa gestão que assume tem que ser cuidadosa com as pessoas que estão dentro da Urcamp. Em nenhum momento, desde que eu entrei na instituição, eu tive algum tipo de animosidade pessoal, alguma situação de alguém fazer campanha para outro e dizerem ‘ele não pode mais continuar na instituição’ e isso nunca ocorreu; os desligamentos que ocorreram na Instituição foram feitos dentro da normalidade e do tamanho da instituição que reduziu. Se pudesse deixar um conselho para a nova gestão diria: cuidar das pessoas que estão na instituição, porque eu fui a timoneira, estava lá, vamos dizer assim, para a coordenação da situação. Aqui vou nominar duas pessoas, não para despreterir as outras, mas entender o respeito que nós temos que ter por todos: o primeiro é o Virgílio, o motorista que me conduziu por bastante tempo, e por conta de situações de idade e que ele vivenciou, ele não acompanha mais, mas tem o meu profundo respeito; e a Gildinha que sabia que eu era bariátrica e não esquecia do meu lanche, cuidando continuamente de minha saúde. E tenho profundo respeito por todos os professores e por todos os funcionários – e isso independe de quem votou a favor ou contra. Estende-se esse respeito à todas as mantidas (Hospital Universitário, Casa da Menina, Jornal Minuano, Museu Dom Diogo, Museu da Gravura), todos os segmentos que a gente trabalhou junto. Então, todos são responsáveis por trazer a Urcamp até aqui. Por óbvio que, quem conduz, quem puxa, quem é o gestor tem a obrigação de trazer todo mundo junto e unido para continuar. O maior cuidado que tem que ter é que a redução de alunos é grande e a retomada será muito lenta.
O nosso orçamento previsto para 2022 está com o déficit de 4%; nós conseguimos, entre o previsto e o realizado, executar 96% dele. Essa, digamos assim, é a melhor peça para ser trabalhada na gestão.