Rodrigo Lopes UEE

ARTIGO: O que são as universidades comunitárias e qual a importância de valorizá-las?

As Instituições Comunitárias de Ensino Superior (ICES) são universidades com caráter público não-estatal. Isso significa que, apesar de não serem administradas pelo estado, o objetivo das universidades comunitárias é público. A maioria das 81 ICES presentes no Brasil são instituições que foram formadas por membros da sociedade civil em regiões nas quais não havia formas de ingressar no ensino superior. Deste modo, foram criadas com o objetivo de garantir um direito fundamental para comunidades em que o “braço” do estado não chegava.

Por conta disso, as universidades comunitárias seguem, até hoje, tendo um sentido de pertencimento muito grande em suas cidades e contribuem de forma significativa para o desenvolvimento regional. Justamente por seu caráter público, essas instituições, além de serem referência pela qualidade do ensino na graduação e pós-graduação, entregam à sociedade uma série de serviços, entre eles atendimentos na área da saúde e jurídica.

Além disso, diferentemente das universidades privadas, as comunitárias não têm como objetivo o lucro de organizações e acionistas e não aplicam seus recursos fora do país. Todos os recursos que as comunitárias recebem são reinvestidos na própria estrutura universitária.

A importância da valorização destas instituições

Uma das grandes pautas do movimento estudantil é a necessidade de uma regulamentação do ensino privado, que tem sido marcado por grandes grupos internacionais, que colocam os lucros acima da qualidade do ensino e que fornecem pouquíssimo retorno à sociedade brasileira. Nesse cenário, o modelo comunitário de ensino deve ser visto como uma alternativa para ajudar a resolver a crise no ensino superior.

As universidades comunitárias, além de fornecerem um ensino de alta qualidade, são referência na produção de ciência e no auxílio às comunidades que as cercam. Esse elemento pode ser observado de maneira muito forte durante o período de crise climática no Rio Grande do Sul, quando as comunitárias contribuíram de maneira fundamental com o auxílio para a população, sendo utilizadas como abrigos, pontos de arrecadação e entrega de doações e pontos logísticos da defesa civil. São, também, marcadas por um ensino com olhar humanizado, que não forma apenas mão de obra técnica, mas cidadãos que compreendem seu papel na sociedade. Ao visualizarmos tais elementos, podemos compreender que as comunitárias são importante ferramenta para o desenvolvimento nacional, para a nossa soberania tecnológica e para o combate à fome, se forem valorizadas!

Apesar disso, as comunitárias têm enfrentado enormes dificuldades no Brasil inteiro. Em um cenário recente de crise econômica e desvalorização do ensino superior, além do grande crescimento de polos universitários EAD de baixa qualidade,  as ICES vêm sofrendo com uma diminuição no número de matrículas e muitas correm o risco de serem privatizadas em um futuro próximo, caso não haja uma inversão nesse cenário.

Também, por conta disso, a realidade nas comunitárias é de pouquíssimas medidas de permanência estudantil, com poucos Restaurantes Universitários, além de custos altíssimos nos que existem, preços altos nos campi para comprar lanches e fazer impressões de materiais e nenhum auxílio para a moradia dos estudantes.

Pensando nesses fatores, é fundamental que tenhamos medidas de valorização das universidades comunitárias e que existam contrapartidas, por parte das instituições, para garantir a democratização do ensino superior através de medidas voltadas para o acesso e a permanência dos estudantes!

Medidas de valorização das comunitárias

Primeiramente, é necessário fazer o recorte de que existem medidas estaduais voltadas para a valorização das ICES, especialmente nos estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Esta particularidade existe pelo fato de serem estados com um grande número de universidades comunitárias, além de contarem com conglomerados que organizam estas instituições, sendo eles a Associação Catarinense das Fundações Educacionais (ACAFE) e o Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas (COMUNG).

Em Santa Catarina, o projeto “Universidade Gratuita” (UG) foi criado para garantir o acesso da população ao ensino superior e tem a meta de oferecer 75 mil bolsas para vagas gratuitas em universidades comunitárias do estado. Apesar de ser um projeto importantíssimo de acesso à universidade, ainda é importante garantir algumas mudanças no projeto, como a priorização para estudantes de escolas públicas no acesso às bolsas e medidas de recorte racial para garantir vagas para os estudantes negros, indígenas e quilombolas.

No Rio Grande do Sul, por outro lado, entrou em prática, em 2024, o projeto “Professor do Amanhã”, que garante mil bolsas de acesso e permanência para cursos de licenciatura nas comunitárias. Apesar de ser um projeto importante, ainda está muito aquém do desafio que as comunitárias gaúchas enfrentam. Principalmente, levando em conta o Artigo 201. da Constituição do Estado, que garante que 0,5% da receita líquida de impostos estaduais sejam destinados para o ensino superior, por meio de políticas públicas, com a finalidade de ofertar oportunidades de ingresso e permanência de alunos no ensino superior comunitário.

Além disso, existem medidas de âmbito federal que devem ser executadas para garantir a valorização das comunitárias. Em 2013, foi aprovada a Lei 12.881/13, que regulamentou as universidades comunitárias nacionalmente e trouxe uma série de ações a serem tomadas em prol destas instituições.

Apesar disso, a chamada “Lei das Comunitárias” não havia sido regulamentada até esse ano, quando, após muita luta do movimento estudantil e das universidades, conseguimos aprovar uma resolução no Conselho Nacional de Educação que consolida a Lei 12.881/13. Agora, nossa luta é para garantir que o Ministério da Educação sancione essa resolução e, dessa forma, coloque em prática as importantes medidas presentes na lei. Um exemplo é o Artigo 2º, que traz os elementos para garantir o acesso das ICES aos editais de órgãos governamentais para o desenvolvimento de atividades de interesse público e para que as comunitárias possam fornecer serviços públicos em conjunto com entidades públicas estatais ou que sejam alternativas para prestar esses serviços nos casos em que eles não são proporcionados diretamente por nenhum setor do estado. Isso abre a possibilidade de investimentos nas universidades comunitárias que podem ser revestidos em restaurantes universitários, bolsas de acesso e permanência e projetos de pesquisa e extensão.

Ainda, é essencial garantirmos a efetivação do Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (INSAES), que regulamente o ensino privado. A realidade é de universidades comunitárias que sobrevivem apenas do valor das mensalidades de seus alunos, disputando, de forma injusta, com polos privados, que não possuem qualidade no seu ensino, cujos cursos, em sua maioria, são ofertados na modalidade EAD, além de contarem com investimentos estrangeiros.

Também é necessário pensarmos em outras ações que o governo federal deve tomar para garantir que as comunitárias sejam uma ferramenta para combater a crise que o Brasil passa no ensino superior. Diversas ICES possuem capacidade ociosa e poderiam fornecer uma educação de ótima qualidade para alunos com bolsas financiadas pelo governo em locais e áreas de atuação estratégicos para o desenvolvimento nacional.

Por fim, é fundamental pensarmos nas formas de certificar a sobrevivência das comunitárias com a garantia da permanência de todos os seus estudantes. Por isso, lutamos para implementar um fundo federal voltado para a assistência estudantil nas comunitárias, como a construção e o subsídio no preço de restaurantes universitários e moradias estudantis e auxílios para transporte e alimentação dos estudantes.

Através dessas medidas, podemos assegurar que o sonho de diversos jovens de ingressar no ensino superior e conquistar seu diploma seja concretizado e que as universidades comunitárias sigam contribuindo para um Brasil mais desenvolvido e soberano!

*Rodrigo Lopes é tesoureiro da UEE-RS Dr Juca e estudante de Economia na Unisinos. 

Com informações do site www.une.org.br